O mais belo soneto em língua inglesa (pelo menos é o que dizia Ezra Pound)

Acabei de gravar uma explicação para esse soneto de Mark Alexander Boyd (Sec XVI). Em edição. Em breve, na minha página do Facebook.

From bank to bank, from wood to wood I run,
Overwhelmed with my feeble fantasy;
Like a leaf that falls from a tree,
Or a reed overblown with the wind.
Two gods guide me: the one of them is blind,
Yes and a child brought up in vanity:
The next a wife born of the sea,
And lighter than a dolphin with her fin.

Unhappy is the man for evermore
That tills the sand and sows in the air;
But twice unhappier is he, I learn,
That feeds in his heart a mad desire,
And follows a woman through the fire,
Led by a blind and taught by a child.

Inferno, o segundo círculo

the double grief of a lost bliss

is to recall its happy hour in pain

Prosseguindo minha leitura de Inferno, no Canto V, após passar pelo vestíbulo do inferno onde estão os indecisos, aqueles que não assumiram compromissos nem com o bem e nem com o mal, e pelo primeiro círculo, onde estão os pagãos virtuosos, o máximo que um homem consegue alcançar sem Deus, eis que Dante e Virgílio chegam no segundo círculo, onde o sofrimento realmente começa.

O guardião é Minos, o famoso minotauro de Creta, e no círculo um enorme redemoinho conduzem as almas dos que se entregaram aos prazeres da luxúria, uma deformação do amor. Estão lá Cleóprata, Helena de Tróia, Paris, Aquiles e tantos outros. E também Paolo e Francesca, duas almas que permaneciam juntos, tais como foram na Terra.

Francesca foi esposa de um grande general, Giovanni, mas o traiu seguidamente com seu irmão mais novo, Paolo. Descobertos, Giovanni os mata em um acesso de fúria. O fato de ambos sofrerem juntos pela eternidade não significa que o amor permanece mesmo no inferno. Para Dante, para quem estava sofrendo no inferno, por próprio desejo, a lembrança dos tempos felizes agravava a dor e por isso Paolo e Francesca sofriam juntos.

Gustave Dore (1890)
Gustave Dore (1890)

Começando…

Midway in our life’s journey…

Assim começa o Canto I da Divina Comédia. Comecei hoje minha leitura do livro de Dante. 

Neste primeiro Canto, Dante está em uma floresta tenebrosa (representando o mundo dos vícios) e diante da luz do sol (iluminação divina) vê uma bela colina e começa a subir. Lá encontra três animais (referência a Jeremias 5.6), o leão (violência), o Leopardo (fraude) e a loba (incontinência), os inimigos que impendem o homem de chegar no Paraíso. Ele desce e encontra o poeta latino Virgílio (símbolo da razão) que explica que não há como passar pelas feras diretamente, que é preciso fazer outro caminho passando pelo inferno, purgatório e paraíso. Convida-o para acompanhá-lo nesta jornada, mas que no Paraíso receberá outra guia pois Deus não permite que Virgílio lá entre, indicando os limites de entendimento da razão humana. 

Nerd, eu?

Exemplo de esquemas bíblicos

Continuando em meus estudos bíblicos, ontem li a passagem de sobre Jefté no livro de Juízes.

A observação de Northrop Frye de que toda literatura ocidental é feita de desdobramentos de esquemas bíblicos possui dois bons exemplos neste texto, de inegável qualidade artística literária.

Quem era Jefté? Era uma espécie de banido do reino de Gilead por ser filho de uma prostituta que vivia em Tobe junto a um grupo de bandidos ou vadios(depende da tradução). Diante da ameaça de invasão dos amonitas, os mesmos que o baniram foram buscá-lo para que os defendessem.

Quantas vezes esse esquema já se repetiu na literatura ou no cinema? Um exemplo clássico é o filme Os Sete Samurais onde um grupo de aldeões vai atrás de samurais, que eles temiam e desprezavam, para os proteger de um saque eminente de um grupo de bandidos. Ou Obi Wan indo atrás de Han Solo para os escoltar até Alderan. A ideia do esquema é um grupo indefeso procurar em um pária a defesa diante de um mal maior.

Na mesma narrativa, Jefté faz um pacto com Iahweh que se fosse vitorioso entregaria em holocausto a primeira pessoa que saísse de sua tenda ao retornar da campanha. Jefté vence e quando retorna sua única filha sai feliz para saudá-lo. Em desespero ele lamenta a promessa feita mas é consolada pela própria filha que ressalta a absoluta necessidade de cumprir a promessa, o que Jefté termina fazendo. Sem entrar na polêmica sobre se tratava de um sacrifício humano ou da castidade da filha (que deveria se retirar para uma vida de isolamento), o fato é que Jefté fez uma promessa sem pensar nas consequências pois acreditava que o sacrifício não seria seu.

Qual o esquema neste caso? Para pagar uma dívida se promete algo aparentemente sem valor, para logo em seguida descobrir o real valor do sacrifício. Até comédias românticas exploram este esquema! Quantos filmes não tem um amigo que arranja um encontro para a amiga para depois descobrir que gosta dela? Ou um pai que aceita um determinado compromisso sem saber que naquele horário surgiria algo de grande importância?

A Bíblia é, entre outras coisas, um livro de sabedoria porque mostra a condição humana no que temos de melhor e pior. Essas coisas estão tão impregnadas em nossa cultura que nem pensamos que a nossa ideia original na verdade já estava esquematizada em breves relatos como o de Jefté. Grandes autores tinham esses esquemas bem claros na hora de montar suas estórias, outros nem sabiam que estavam influenciados. Uma outra classe de autores simplesmente chegaram no mesmo esquema simplesmente observando a realidade e abrindo-se para a condição humana.

Poesia na Lorelei Books

Uma das coisas interessantes aqui em Vicksburg é conhecer o comércio familiar, aqueles pequenos negócios que o próprio dono toca diretamente, inclusive fazendo o atendimento. Um desses lugares é a Lorelei Books, uma pequena e simpática livraria que fica na rua principal, a Washington Street.

Laura e seu marido mudaram para Vicksburg há cerca de 8 anos, vindo da Virgínia. Compraram o espaço da livraria e montaram sua casa no segundo andar. Normalmente vamos lá uma vez por semana e sempre conversamos um pouco.

Esta semana ela nos convidou para um evento exclusivo em sua casa, após o fechamento da livraria. Duas poetisas da região iriam ler alguns poemas e autografar o livro que estavam lançando.

Foi uma noite muito interessante onde não só conhecemos um pouco mais os donos da livraria como também tivemos oportunidade de escutar boa poesia e conversar um pouco com as poetizas.

Lenore Weiss é filha de imigrantes húngaros judeus. Viveu a maior parte de sua vida adulta em Ockland e recentemente se mudou para Monroe, 80 milhas daqui. Pelo que percebi está se reconectando à sua herança judaica, inclusive estudando hebreu. Uma das poesias que leu, falando da experiência de morar ao lado de um hospital e se acostumar com o movimento e barulhos de ambulâncias indo e vindo, faz uma ligação justamente com esta herança.

So do you believe that the villagers living outside
Dachau and Auschwitz gradually ceased
to hear each train groaning into the station?
or did they listen, like me,
then go about their business?

A outra poetisa, Melinda Palacio, também é descendente de imigrantes, mas no seu caso trata-se de imigrantes latinos. Nascida na Califórnia, também se mudou recentemente, para New orleans. Seus temas abordam justamente a mistura cultural do seu estado natal, onde imigrantes mexicanos e americanos convivem lado a lado, muitas vezes sem se misturar ou entender uns aos outros.

Keep your red cowboy boots, your tattoo of the Virgen de Guadalupe,
your mother’s huipil.
When did you become so afraid of being alone?

Comprei os dois livros e coloquei na fila. Sempre estou lendo um livro de poesia, no momento estou com uma coletânea do T. S. Elliot. Elas entraram na fila.

Top 5 2013: Livros de ficção

Foi difícil, afinal foram 42 obras lidas de ficção, incluindo as releituras. Em uma primeira passagem, escolhi os livros realmente especiais, em condições de entrar no top 5, sem preocupação com a quantidade.

Esta pré-lista ficou com 12 obras. O mais difícil era selecionar 5 destes 12 maravilhosos livros. Depois colocar os 5 em ordem, o que não foi tão difícil pois segui mais a intuição, sem pensar muito a respeito.

Eis o resultado dos 5 melhores livros de ficção que li este ano.

5. O Lobo da Estepe (Herman Hesse). O livro já era bom, mas a parte final é de cair o queixo. Um aviso, tem que ter uma certa bagagem literária e uma sensibilidade desenvolvida por anos de leitura para enxergar o que Hesse queria mostrar com a viagem de seu protagonista dentro da sala onde o preço para entrar é a razão. E era mesmo.

4. Uma Fábula (Faulkner). Um livro até certo ponto difícil de ler, pelo menos em sua primeira metade. Faulkner não usou a narrativa linear, coisa que adoro!, e por vezes o leitor pode ficar meio perdido. No fundo trata-se de um manifesto anti-guerra, profundo como só uma excepcional literatura consegue ser.

3. Édipo em Colono (Sófocles). Difícil escolher uma das três peças de Sófocles sobre a estória de Édipo. Optei pela segunda. Simplesmente maravilhosa; todos os diálogos devassando a natureza humana e definindo com força o que seja uma tragédia.

2. A Outra Volta do Parafuso (Henry James). Fiquei fascinado pela narrativa de James e a forma como ele consegue nos colocar dentro de sua fantástica estória e nos conduzir a um dos finais mais ambíguos já escritos. Coisa de mestre.

1. Ficciones (Jorge L Borges). Demorou mas finalmente consegui penetrar no mundo de Borges. Impressionante como consegue manejar a linguagem para contar estórias aparentemente superficiais mas que escondem um universo de profundidade. Gênio.

Ficam como menção honrosa:

– A Marquesa d’ O – Von Kleist

– Odisséia – Homero

– Otelo – Shakespeare

– Enfermaria nr 6 – Tchekhov

– A Metamorfose – Kafka

– Contos Amazônicos – Inglês de Sousa

– O Reino Deste Mundo – Alejo Carpentier

Salvo engano, no total ficaram 2 americanos (Faulkner e James), 2 gregos (Homero e Sófocles), 2 alemães (Hesse e Kleist), 1 inglês (Shakespeare), um tcheco (Kafka), 1 russo (Tchekhov), 1 brasileiro (Souza), 1 cubano (Carpentier) e 1 argentino (Borges). Bem eclético este ano, hein?

Fica então essa lista de leitura com sugestão!